7 de novembro de 2009

Quantos sexos há afinal?



O Nuno Monteiro Pereira, pessoa que eu muito estimo, dá por vezes ouvidos às correntes mais "politicamente correctas" da "sexologia", produzindo afirmações que não estão à altura da sua inteligência. É o caso desta:

"Existem várias teorias mas a mais marcante e a que mais se aproxima da realidade prática e clínica é a que contrapõe aos dois sexos clássicos (masculino e feminino ) à existência de mais três, o pseudo-hermafroditismo masculino, o pseudo-hermafroditismo feminino e o hermafroditismo verdadeiro, num total de cinco sexos" (ver aqui).

A teoria dos 5 sexos parece-me completamente absurda. Basta pensar o problema à luz da evolução da espécie humana (ainda estamos no ano de Darwin, não é). A espécie humana, qualquer biólogo mais “conservador” o dirá, é bissexuada. Este facto singelo tem a ver com a forma de reprodução e não com qualquer agenda vanguardista.

Mais. Ao contrário do caracol, o ser humano, individualmente considerado, só tem um tipo de gónadas (ou masculinas ou femininas). Quer isto dizer que os hermafroditas não são humanos? Claro que são humanos. Mas também são uma raríssima excepção. Ou seja, tendo gónadas masculinas e gónadas femininas, poderá dizer-se que têm os dois sexos, não que constituem um terceiro sexo. Por maioria de razões, os pseudo-hermafroditismos (masculino ou feminino) não representam senão estados intersexo, como diz, e bem, Allen Gomes, no mesmo artigo.

Do mesmo modo, os caracóis são hermafroditas e não deixariam de o ser, acaso descobríssemos uma mão-cheia de caracoletas que, por infelicidade, tivessem nascido só com gónadas masculinas ou femininas.

Anne Fausto-Sterling, Professora de “Biologia e Estudos de Género” na Brown University, enunciou, em 1993, a sua teoria dos cinco sexos como “provocação” - a palavra é dela. O problema que enfrentava – como activista e não como cientista – tinha a ver com o tratamento dado pela medicina às crianças que nasciam com ambiguidade sexual (herms, merms e ferms). Estavam em causa as manobras cirúrgicas e hormonais a que estas crianças eram submetidas para se “encaixarem” num dos sexos, por vezes com resultados – físicos e/ou psicológicos - desastrosos. Era a “causa” dos intersexuais que interessava a Fausto-Sterling, não o Nobel para a descoberta extravagante de mais três sexos.

Isto é, não levando muito a sério a sua teoria dos cinco sexos, Fausto-Sterling serviu-se dela para nos convencer de que os intersexuais são uma minoria normal, e de que as condições intersexo não são patológicas.
Citando o “especialista em ética médica” Laurence B. McCullough, Fausto-Sterling afirmaria em 2000 (“Five sexes, revisited”) que “ As várias formas de intersexualidade devem ser definidas como normais. Todas elas caem dentro da variabilidade de sexo e género estatisticamente expectável. [Nota: repare-se que em 1193 a autora estimava em 4% a percentagem de intersexuais e em 2000 baixou a estimativa para 1,7%. Porém, se analisarmos as parcelas que lhe permitem chegar a este número, poderemos concluir que as 5 maiores não são de verdadeiras condições intersexuais. Se retirarmos estas, ficamos com uma percentagem de 0,02. (Ver aqui as contas, na resposta de Leonard Sax a Anne Fausto-Sterling) ]. E continua: "Além disso, apesar de certos estados patológicos poderem acompanhar algumas formas de intersexualidade, e poderem requerer intervenção médica, as condições intersexo não são, elas próprias, doenças”.

Mas é sina que, hoje em dia, seja “politicamente correcto” defender radicalmente o direito de qualquer minoria à “normalidade”, nem que para isso seja preciso criar cada vez mais aberrações no discurso “científico”, “desconstruindo” tudo e mais alguma coisa. A trissomia 21 deixa de ser um sindroma e passa porventura a ser uma variante “estatisticamente expectável” da espécie humana, a surdez deixa de ser uma patologia e passa a ser uma cultura minoritária que é preciso respeitar (por exemplo, deixando surdos os filhos dos surdos), a homossexualidade passa de situação considerada não-patológica a condição hiper-normal, por oposição a uma heterossexualidade construída por auto-mutilação homofóbica, e a espécie humana – que já tinha deixado de ter dois sexos para ter dois géneros que, parece, se querem cada vez mais iguais – volta a ter sexos…mas só se forem cinco. E a procissão ainda vai no adro.

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